terça-feira, 8 de setembro de 2015

regresso

 
Conduzo no sentido inverso.
Tento concentrar-me na estrada e ao mesmo tempo as últimas 24h ocupam todo o meu cérebro focando a minha atenção para o estranho que se aproximou, sentou, meteu conversa.
Não me recordo que perguntas fez ou se fui eu que fiz ou se terei sido eu a dar inicio à tal conversa que tanto odeio e eis que me vejo no mesmo papel dos que aponto a dedo, feliz e inocente das perguntinhas curiosas.
Recta, o caminho até casa é escuro porque fiquei até às últimas e tive me impor a mim próprio a cumprir o que havia dito ao estranho. Parto amanhã. Hoje. Quando tinha pensado fazê-lo ontem se ele não se tivesse sentado na minha mesa.
Engano as horas do estomago e nem sequer paro para um café, uma água, faço o regresso a seco no rebobinar das horas ao contrário e levo a mão ao telemóvel à procura de recados de um estranho.
Estaciono.
O coração acelerado não liga a chaves fora da ignição.
 

segunda-feira, 7 de setembro de 2015

está ocupado?

 
Estou decidido a regressar, já tive o bastante de muda de ares e tenho saudades da minha casa.
Antes mesmo que peçam respondo que podem levar a cadeira, mas desta vez o homem pergunta se não incomoda se se sentar na minha mesa.
Avalio-o rapidamente, confesso que sou desconfiado naturalmente e não me agradam a proximidade de estranhos e a convivência destes comigo metendo conversa, mais ainda em tempo de férias, quero paz e sossego com os meus pensamentos, já é difícil só por si achar um local tranquilo para me sentar.
Passa no primeiro exame. Traz um jornal debaixo do braço, é mais velho que eu, nada de exuberâncias mas tudo roupa boa. (Quem disser que isto é materialismo, está a mentir; Todos nós nos analisamos pelo que vestimos).
De qualquer forma não vou ficar muito tempo, estico a mão num gesto de aceitação, ele senta-se e só então reparo na cor surpreendente dos seus olhos quando retira os óculos de sol, agradecendo-me.
Quero olhar outra vez e de novo mas não quero ser surpreendido a encará-lo.
 
 

sexta-feira, 4 de setembro de 2015

feios e bonitos

 
Muitos estrangeiros.
Muita gente bonita.
Muita gente feia que se acha bonita.
Muita gente que nem é bonita nem feia nem é nada, apenas consomem o ar e ocupam espaço, fazem muito ruído e chegam primeiro que todos a qualquer parte.
Sinceramente não sei o que faço aqui.
Em que grupo me incluo?
Não chego a lado algum, vou à praia e fico-me pelas esplanadas a tomar refrescos por detrás dos meus novos óculos escuros, o meu inglês dá para responder que podem levar a cadeira que está livre na minha mesa, penso no CD que deitei fora e arrependo-me de acto tão corajoso, ligo aos pais e digo que me estou a divertir imenso.
Logo devo ser um menino bonito.
 
 

terça-feira, 1 de setembro de 2015

quilómetros de pensar

 
Primeiro dia de férias e sigo viagem para Sul.
A estrada traz-me sempre memórias que não desejo.
Provavelmente porque acompanho a viagem com músicas que me recordam episódios de momentos que foram muito bons. Até se tornarem num bater de porta amargo e incompreensível.
Suponho que comigo sempre tudo há-se ser assim, maravilhoso de inicio, intenso e depois estupido.
A partir de certa altura deixei de investir no meu coração. Não vale a pena se já sei como vai acabar, melhor nem ter começo, melhor uma noite de copos e o flash encantador das luzes a disfarçar no som batido em altos decibéis as palavras que achamos que se dizem.
Não se dizem, mimetizam-se na ponta dos lábios, depois roubam-se beijos a esses mesmos lábios num qualquer recanto escuro, faz-se o resto da noite numa pensão barata onde ninguém conheça ninguém e está tudo bem.
Não percebo porque guardo estes CD's.